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Mais um caixote para atirar para lá a tralha que anda para aqui perdida.
Oh, the deceiving smell of Spring....
que me perdoe o paterfamilias, mas isto na língua de Camões não teria o efeito de aliteração pretendido...
a não ser que fosse qualquer coisa do género:
ah, o erro de pensar que é primavera...
que não tem o mesmo ritmo nem a sibilação da língua dos bifes.
encaixa, encaixa..
encaixa o meu horário no teu,
encaixa o horário dela no meu, encaixa o horário uma da outra, encaixa o orfeão, mais as explicações, mais a catequese e o judo e o karaté,
encaixa a minha ginástica mais a tua formação,
encaixa os tpcs dela e dela, mais os meus e os teus,
encaixa a cama, se não, encaixamos o caixão!
Há um determinado tipo de silêncio que é como uma nódoa de gordura.
quero-te para mim
quero-te aberta e positiva
quero-te clara e vibrante
quero-te a ver o sol esteja ou não esteja sol quero-te a acordar bem quero-te branca de momentos bons existentes ou potenciais
quero-te, Gabriela.
Quero-te Gabriela.
Dei por mim a dizer eu quebro-a, mas eu quebro-a!, referindo-me à minha filha mais velha.
Eu sou lá alguém para quebrar quem quer que seja, uma filha minha ainda por cima?!
Eu devia era quebrar em mim tanta coisa, tanta.
Sento-me cruzo a perna direita sobre a perna esquerda a minha mão direita pende e toca na perna cruzada não preciso de mais sinto-a à pele cheia de furinhos, aquilo a que chamam pele casca de laranja passo os dedos passo os dedos e tiro-os cheia de um sentimento que não ouso nomear descruzo a perna e fico aqui a olhar para o teclado tanta porcaria que precisava de ser extirpada e não é
Não me apetece.
Não te apetece o quê?
Não me apetece nada.
Então, apetece-te tudo?
Nada me apetece, nada!
O nada apetece-te?
Deve ser isso...
Nada.
Tenho muito sono.
Tenho muito pouca paciência.
Tenho muito poucas ideias produtivas.
Tenho muito pouca energia.
Tenho muito pouco dinheiro.
... eis como o muito se passa por quase nada...
Não gosto de dias cinzentos.
Não sou fã de dias cinzentos.
Os dias cinzentos são-me desagradáveis.
Os dias cinzentos não me aprazem.
Não aprecio dias cinzentos.
Detesto dias cinzentos.
Não posso tomar café na varanda.
Naqueles dias, fazíamos assim: eu levantava-me, tomava banho ou lavava a cara e os dentes, às vezes ficava até mais tarde na cama e só tinha mesmo tempo de lavar a cara, vestia-me e ia para a cozinha, preparar o pequeno-almoço. No inverno fazia um frio de gemer e no verão, abrindo-se a persiana, a cozinha era inundada de uma luz amarela ou cinzenta, conforme o tempo que fazia lá fora. Mas no inverno era fria. Eu ligava o termoventilador e fazia o meu pequeno-almoço, que ia engolindo à medida que preparava os restantes. Na altura, o que me apetecia era sentar-me à mesa e com calma beber o meu leite com café e comer a minha torrada, mas quais torradas, não havia tempo, era mesmo só um bocadinho de pão com manteiga...
Depois, levava o leite com chocolate à Mr. e preparava o nestum da Gr. Nem sei porque é que ligava o termoventilador, agora que penso nisso. Acabavam as duas por tomar o leite no quarto, enfim...
Depois, depois... ah! sim, depois preparava-lhes as roupas. Eu sei, seria mais inteligente prepará-las de véspera, mas não era isso que me consumia mais tempo. Pois, preparava as roupas e ajudava-as a vestirem-se. A Mr. demoooooravaaaa muito teeeemmmmpooo a vestir-se e depois nunca queria a roupa que eu lhe dava, tinham de ser saias ou vestidos ou léguinhos, como dizia a Gr. E para a pentear? senhores, que tormento!
A Gr. deixava-me vesti-la, mas também tinha de ser sempre léguinhos!
Quando elas já estavam vestidas e penteadas, mandava-as lavar os dentes e eu ia acabar de me arranjar, punha um bocado de creme na cara, perfume e ala para a garagem.
Eram assim umas manhãs meio parvas, em que toda eu era stress, com medo de chegar atrasada à escola da Mr., ansiosa por ir tomar o meu café, com calma, pensando que não queria ir para casa sozinha e ficar o dia todo sozinha e o frio, jesus, o frio no inverno naquela casa! Era assim uma coisa estranha: por um lado, queria muito aquele momento do dia em que me ficava com a chávena quente de café na mão, a pensar no que podia fazer, mas depois saber que voltava para casa... não me apetecia... ficava ali, a inventar coisas que era preciso comprar, a adiar a hora de voltar.
Preciso de me lembrar disto, de não me esquecer, porque tenho muitas saudades delas assim pequeninas, a Gr. a deixar-me pegar nela ao colo, tão grande, mas tão meu bebé, a Mr. a rezingar, porque me estás a puxar o cabelo, pára! o M. a vir dar-me um beijinho e um abraço perfumado, que bem que ele cheirava, caramba, às vezes ainda sinto o cheiro dele, e dão-me umas tonturas que acho que vou morrer, mas estamos em 2070 e o teste que fiz no facebook dizia que eu só morro em 2073, portanto ainda me faltam 3 anos.
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