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Mais um caixote para atirar para lá a tralha que anda para aqui perdida.
Este fim de semana, o pai e a mais nova foram dar uma volta ao nuorte e eu fiquei com a mais velha, que ainda está em modo estágio, portanto, passei muito tempo sozinha.
Podia ter feito daquele tipo de limpezas em casa que só a "solidão" permite, mas optei por fazer nada, para além de ver filmes, ler e andar por casa aborrecida.
Vi Licorice pizza e Tudo em todo o lado ao mesmo tempo. Gostei muito do licorice pizza. É aquele tipo de filme que nos deixa suspensos, à espera que aconteça algo absolutamente estranho e desviante, mas depois nunca acontece e acabas por ficar contente por nada disso acontecer e porque acaba como tu previas, mas tinhas medo que o previsível não acontecesse.
Estou a terminar um policial escrito pelo Paul Auster, sob um pseudónimo que agora não recordo e tenho ali num montinho os livros que vou levar para a praia (incluem Elena Ferrante).
Estas são aquelas semanas "parvas", em que me sinto num limbo, à espera que venham as férias "a sério" e acabo por não aproveitar o tempo.
o pai cá de casa vai ser operado novamente, desta vez à clavícula;
o mais velha anda cansada e mal humorada (levantar todos os dias às 6.30, chegar a casa às 19.30 e ainda ter tarefas da escola para fazer é puxado);
a mais nova numa fase complicada, com a qual não sabemos lidar. Pudessemos nós ir à escola e partir as trombas a bullies e cenas assim... ;
eu cheia de trabalho, mas a aproveitar o facto de o pai ainda se poder mexer para cumprir com o ato de treinar trinta minutos quase todos os dias, aqui na sala, acompanhada de senhoras várias, todas elas boas como pipocas, que se dispõem a colocar vídeos no iutubi.
É o meu momento zen, que se reduzirá significativamente quando o pai vier da operação.
Há quem viaje, quem cozinhe, quem leia, quem medite. Eu castigo o corpo e foco-me na dor muscular para afastar os demónios, os pensamentos destrutivos, os medos e ansiedades.
Acabei há pouco um livro de ficção à laia de diário de um autor que desconhecia (Teju Cole), regressei ao Infinito num junco, mas necessitava agora de um bom romance que me levasse para a cama e me embalasse as noites.
A biblioteca do "meu" agrupamento é muito boa, bem melhor do que a municipal. Desde que sou professora bibliotecária (ie tenho de dar horas à escola na biblioteca), já trouxe para casa os dois clássicos da Harper Lee e estou a meio de um Leila Slimani.
Todas as terças-feiras, dia em que lá vou "dar" as minhas horas, encontro livros que fazem parte da minha "lista de livros a ler", de autores estrangeiros e nacionais, quer dos mais antigos, quer dos mais recentes, mas recentes mesmo, acabados de sair, edições fresquinhas e a cheirar a novo.
A biblioteca é frequentada à hora de almoço pelos mais novos, que querem é agarrar-se aos computadores para jogar (mas estão condicionados, claro) e pelos mais velhos que vão fazer trabalhos de casa ou trabalhos de grupo. Nas horas que lá estou, poucos são os miúdos que levam livros para casa.
Já eu, fico a babar-me para cima das estantes.
Acabei ontem à noite os "Doentes do Doutor García".
É assombroso. A teia de acontecimentos e de personagens, umas ficticías, outras reais, o desenrolar aparentemente desorganizado e cheio de analepses e prolepses, as descolcações no espaço e nas personagens, nas formas de narrar, ora na primeira pessoa, ora na terceira, o ter de perceber onde estamos a cada capítulo, quem nos fala ou de quem nos falam...
o final, a pender para a tragédia premente que é a nossa enquanto peões...
é o livro de uma vida.
mas este ano abro uma excepção (assim, como deve ser, com o p lá no meio) e decido que vou ler mais.
Acabei na sexta à noite o Meridiano 28 de Joel Neto e já dei comigo a ler os doentes do Doutor García, de Almudena Grandes.
Não sei qual é o fenómeno, mas é uma coisa frequente: dar por mim a ler muitos livros do mesmo autor ou pegar em autores cujas temáticas são semelhantes.
Parece que, sem que seja propositado, ando numa onda de romance de espionagem, onde se misturam realidade e ficção.
Ler mais é aquilo que decido fazer no ano 2022, a ver se me engrandeço e alargo o meu mundo.
Na sexta-feira, à noite, acabei o "Descascando a cebola" do Gunter Grass. Andava com ele para trás e para diante desde agosto. Nos entretantos, li uns quantos, mas o Grass andou sempre comigo. Numas noites lia vinte e tal páginas, noutras não conseguia passar além das duas.
Nunca demorei tanto tempo a ler um livro, nem o Guerra e Paz.
Não foi uma leitura tranquila, estive sempre à espera de ler alguma forma de expiação explicíta por parte do homem, por ter sido membro das SS e fui sempre debatendo comigo própria se devia continuar a ler perante a ausência dessa expiação.
Depois, o combate foi entre a Gabriela pessoa e a Gabriela leitora.
A primeira argumentava que na vida vamos-nos deixando levar pelas correntes sem pensar e que esse deixarmo-nos levar nos pode conduzir ao lado errado da "Força", especialmente quando somos novos e cheios das hormonas que nos fazem sentir imortais.
A segunda via o "descascar da cebola" como um ato de expiação.
Não sei se isto assim, sem mais explicações, faz sentido a outras pessoas. Nem sei se daqui a um mês me vai fazer sentido a mim. Creio que quero dizer que a forma como o autor desenrola os acontecimentos dessa altura da sua vida é, de facto, como se desmanchasse uma cebola. Podia ter escolhido outro legume, outra fruta desmanchável, mas só quem já desmanchou cebolas sabe como é difícil fazê-lo.
Comprei e li de uma penada "Balada para Sophie".
Que maravilha! reli as páginas finais ao som da balada composta por Filipe Melo e não consegui evitar um par de lágrimas.
Entretanto, a minha mãe entrou no quarto e veio-me perguntar de quem eram as cuecas deixadas na casa de banho e lá se foi o que quer que fosse que ia ali na minha alma, se é que eu tenho uma.
Peguei na edição comemorativa dos Cem anos de solidão que comprei aqui há uns anos, não me lembro onde nem quando porque contra o que é normal não escrevi a lápis no cantinho onde comprei nem quando, e decidi começar a ler ou melhor reler dado que o li pela primeira vez há muitos anos, mas mesmo muitos porque não me lembro de nada
não me lembro de precisar da árvore genealógica nem de estar sempre a confundir os aurelianos e os arcadios e também não me lembro de ficar incomodada com os laivos de pedofilia
já no outro dia, ao ver na televisão uma adaptação do amor em tempos de cólera, me senti um bocado incomodada com as paixões púberes, correspondidas, de florentino ariza e agora não consigo evitar parar com frequência na leitura destes cem anos, abanando a cabeça em jeito de mas como é que não me lembro de nada disto ou mas porque é que o gabriel tinha de dar nomes tão parecidos a esta gente e de onde vem esta atração por pré-adolescentes de mamas a nascer?
Será a minha mudança de idade?
Depois do jantar e da cozinha (mais ou menos) arrumada, conduzo-as para o meu quarto. Está quentinho. Levo três livros: o meu e um para cada uma delas. A Mr. está a ler a saga Harry Potter, vai no terceiro volume, para a Gr. escolho eu para facilitar a coisa e não haver dúvidas de que tem de ler um livro de gente grande (escolhe regra geral os livros da Bia e o unicórnio, que já leu ou um qualquer com mais imagem do que texto).
Sentamo-nos na cama e lemos. Eu agarro-me às intermitências da morte de Saramago, a mais velha aos dementors (salvo seja) e a mais nova a uma aventura no supermercado. Sou interrompida pela mais velha e pelos seus brados ai que isto é mesmo assustador, ai que mete mais medo do que os filmes e pela mais nova, à medida que vai encontrando palavras escrita na ortografia pré acordo e se espanta, como se fossem palavras novas e raras.
Aquela coisa que eu defendia de não obrigar os meus filhos a ler foi pelo cano da experiência maternal abaixo, aquela teoria do Pennac de que o verbo ler não tem imperativo foi pelo mesmo caminho.
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